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“…não se represa um rio, não se engana a natureza, faça a represa o que quiser, pois o rio cedo ou tarde vai arranjar um jeito de rasgar a terra, abrir um caminho, e voltar a correr em seu leito de origem”, Fernando Pessoa*1 (1888-1935).
Estamos de volta com o primeiro artigo da segunda fase da jornada Carreira 50+. Depois de abordarmos a importância do autoconhecimento e da ressignificação da própria vida para o desenvolvimento profissional, agora, vamos falar sobre como reconhecer seus talentos e forças, de forma que sejam utilizados de maneira proveitosa e significativa, no processo de reposicionamento de carreira.
Mas, inicialmente, é preciso entender o que é talento. Segundo o pai da Psicologia baseada em forças, Donald O. Clifton*2,“talento é qualquer padrão recorrente de pensamento, sentimento ou comportamento que pode ser aplicado de forma produtiva”. Clifton também destaca que a autoanálise é fundamental para que o potencial de força de cada um seja identificado. O cientista sugere que, ao realizarmos uma atividade específica, a forma de fazê-la seja observada com acuidade e, a partir disso, algumas perguntas sejam feitas e respondidas. Por exemplo:
· Qual o grau de atenção que você necessitou para executar a tarefa?
· Em quanto tempo você conseguiu aprender a realizá-la?
· Qual foi o nível de dificuldade que você teve?
· A execução da tarefa lhe trouxe satisfação?
O estudioso sugere que essa metodologia seja aplicada a diferentes atividades. “Com o tempo, seus talentos dominantes se revelarão e você poderá refiná-los e transformá-los em uma força poderosa”, ensina ele.
Importante destacar que os talentos, embora sejam fortalezas, têm de ser trabalhados e aprimorados constantemente. Aprender é para sempre.
Prazer em realizar
“Põe toda a tua alma nisso, toca da maneira como sente a música!”, Frédéric Chopin*3 (1810-1849).
O conselho desse grande gênio da música pode ser empregado em qualquer profissão ou carreira. Se o coração não bater mais forte, se a alma não estiver presente, não é possível usufruir da jornada. Esse também é o pensamento da skatista Rayssa Leal, a Fadinha. Não foi à toa que a menina de apenas 13 anos de idade ganhou, em sua categoria, medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Com tão pouca idade, ela sabe que a performance só é digna de nota, se há prazer em sua realização. “Tento ao máximo me divertir. Quando estou na pista, os minutos vão passando mais rápido, vou ficando mais leve, mais solta e bem mais feliz. Tudo vai fluindo naturalmente”, disse ela em entrevistas a vários veículos de comunicação do País, por ocasião de sua premiação.
É óbvio, só que não
Aqui, peço licença a Cris Barata, que me convidou para ser parceira dela nesse projeto, para contar uma história pessoal. Essa memória foi resgatada durante o trabalho de reposicionamento de carreira que realizei com ela.
Sempre gostei de escrever, sempre mesmo. Aos cinco anos, aprendi a ler com a minha avó materna. Quando ganhei um pouco de fluência, a leitura e a escrita passaram a ser minhas companheiras do dia a dia. Outra paixão, desde a primeira infância, foi – e é – a música. Minha mãe cantava muito com a gente. Ouvia sem parar as músicas que gostava até sabê-las de cor. Buscava interpretar as letras, aprender com elas. Isso era natural. Coisa minha, ninguém me ensinou. Escrevia longas cartas para uma amiga-irmã que via todos os dias na escola. Contava histórias, fazia poesia… Escrever, ler e ouvir músicas eram atividades que me davam um prazer imenso. Mas nunca olhei para isso como forças.
Quando fui para o Ensino Médio, escolhi a área de Biológicas. Queria ser médica pediatra. Um sonho de infância. No primeiro ano, desisti da Medicina. Tinha umas dez matérias relacionadas à área e comecei a lamentar a minha escolha. Era maçante. Na época, também pensei em estudar Genética e Psicologia. Também gostava muito das matérias de Exatas. E por isso também pensei em profissões relacionadas à área: Matemática, Física, Engenharia, Astronomia etc. Mas o encantamento ia mudando: transitava de área em área com grande desenvoltura e confiança. A cada descoberta, um novo desejo de profissão. Quando essa história me vem à cabeça, lembro de uma frase da música Nada Tanto Assim, do Kid Abelha, sucesso dos anos 80: “Eu tenho pressa e tanta coisa me interessa, mas nada tanto assim”. Sentia que não tinha nenhum talento natural. Não era como algumas pessoas que, desde pequenas, já sabem o que querem fazer. Chegava a ser um martírio.
No segundo ano, passei a ter aula de Química com o saudoso professor José Fregonezi. Ele era especial. Educador de primeira, ia além do conteúdo de sua matéria. Ele tinha a sabedoria de um mestre – lógico que por causa dele também quis fazer Química. Sempre que possível, conversava com ele. Entregava alguns textos meus para ele ler e ele sempre devolvia com comentários e sugestões. Nessa altura, imagino que você deva estar me perguntando: Você pedia para um professor de Química ler os seus textos? Sim, eu pedia. Não tem muita lógica, eu sei, mas eu pedia. E foi graças a esse contato e à boa-vontade dele, que, quando chegou a hora de escolher qual faculdade fazer, escolhi Jornalismo. Era tão óbvio e eu não enxergava. Precisei do olhar generoso do Prof. Fregonezi, para descobrir que minha fortaleza, meu talento, estava na gestão das palavras, na Comunicação.
Ao longo de minha carreira, a escrita foi perdendo espaço para outras atribuições relacionadas ao cargo executivo que ocupava. Escrevia, mas já não era tão “divertido”. Ao me reposicionar, pude me reconectar com a menina que fui e, dessa forma, devolver essa paixão e esse talento ao centro da minha carreira, ao meu core business.
Conexões poderosas
“Acreditar que os pontos vão se ligar, em algum momento, vai lhe dar confiança para seguir seu coração, mesmo que isso leve você para um caminho diferente do previsto”, Steve Jobs*4 (1955-2011).
O aprendizado de uma vida, a paixão guardada no coração, os talentos não-explorados ou esquecidos, podem, sim, transformar-se em uma oportunidade de negócio, em um produto. Por isso, o caminho indicado por tantos expertos está relacionado às experiências individuais, à observação e análise, a novas descobertas sobre como “divertir-se” sempre, para fazer melhor.
Em algum momento todas essas fortalezas irão se conectar. É como o os afluentes que desembocam em um rio maior. Os rios correm, levam vida, mostram sentidos e uma hora se encontram em uma via maior, mais profícua e prazerosa de navegar. Ouça o seu coração e deixe-se ser surpreendido nessa jornada.
Projeto Carreira 50+
O projeto Carreira 50+ é uma parceria entre Márcia Carneiro, jornalista, especialista em Comunicação Integrada de Marketing e com formação em Dinâmica dos Grupos, e Cris Barata, coach, empreendedora e proprietária da Papilio Empresarial.
Com expertises em suas áreas de atuação, as duas se associaram nesse projeto com o objetivo de compartilhar aprendizados e experiências vividos por elas mesmas em suas transições de carreira.
Além disso, o Carreira 50+ visa orientar e guiar aqueles que necessitam de um trabalho mais focado e individual no processo de ressignificação de sua trajetória pessoal e profissional, transformando o aprendizado de uma vida em oportunidade de negócio.
*1 Fernando Pessoa: Foi um poeta, filósofo, dramaturgo, ensaísta, tradutor, publicitário, astrólogo, inventor, empresário, correspondente comercial, crítico literário e comentarista político português. É o mais universal poeta português.
*2 Donald O. Clifton (1925-2003): Foi um psicólogo, educador, autor, pesquisador e empreendedor norte-americano. Ele fundou a Selection Research, Inc., que mais tarde adquiriu a Gallup Inc., na qual se tornou presidente, e desenvolveu a CliftonStrengths, a avaliação psicológica on-line da Gallup. Clifton foi reconhecido com uma comenda presidencial da Associação Americana de Psicologia como “o pai da psicologia baseada em forças e avô da psicologia positiva”.
*3 Frédéric Chopin: Foi um músico polonês, radicado na França. Considerado um dos mais importantes compositores para piano, é admirado no mundo inteiro.
*4 Steve Jobs: Nascido na Califórnia (EUA), Jobs foi um inventor, empresário e magnata americano no setor da informática. Notabilizou-se como cofundador, presidente e diretor-executivo da Apple Inc. e por revolucionar seis indústrias: computadores pessoais, filmes de animação, música, telefones, tablets e publicações digitais.